sexta-feira, agosto 05, 2005

Carmen Miranda 50 anos de ausência


Maria do Carmo, filha de José Maria Pinto Cunha, barbeiro, e Maria Emília de Miranda, nasceu às 3 horas do dia 9 de Fevereiro de 1909, em Várzea de Ovelha e Aliviada, Marco de Canavezes, Portugal.Já no fim de 1909, o seu pai mudou-se para o Brasil, à procura de uma vida nova. Assim que se instalou, mandou buscar a família. A Bituca, como era chamada Carmen, cresceu no meio do samba do Rio de Janeiro, numa humilde pensão familiar no 1º andar da travessa do Comércio, nº 13.Aos 15 anos, começou a trabalhar como costureira de chapéus. Com 16 anos, começou o trabalho de vendedora de gravatas, onde conheceu o primeiro namorado, Mário
Cunha, que havia sido campeão de Remo. Nesta época, mudou o seu nome para Carmen Miranda.
Convidada para a cantar numa festa no Instituto Nacional de Música, foi descoberta por Josué de Barros, que a convidou para gravar um teste na Victor, o qual se tornou no seu primeiro disco, um sucesso que continha canções como Tahi. O sucesso transformou-se num contrato com a RCA, ganhando mais fama e tornando-se na pequena notável.A ameaça de guerra na Europa mexe com o Brasil, e Carmen é a favorita de Getúlio Vargas, um líder nacionalista que celebra um novo Brasil, como muitas das músicas cantadas por Carmen. Carmen começa a gravar OS seus primeiros filmes com a irmã, Aurora, dos quais restam poucos minutos. o seu sucesso chega à Argentina, onde são conhecidas com "Las irmanas Miranda". Grava o filme "Banana da Terra", onde aparece pela primeira vez como baiana.

Em 1939, época dos grandes casinos no Rio, numa apresentação sua no casino da Urca, um poderoso empresário da Broadway, um dos Irmãos Schubert, vindo no Transatlântico Normandie, vê a imagem cheia de promessas. No dia seguinte, Carmen vai com ele ao navio para conversar. Séria, sabia que deveria jogar suas cartas muito bem. Dois dias mais tarde, assinaram o contrato. Carmen vai para a Broadway. Mas é impedida de levar a sua banda. Ela sabia que precisava de uma banda que soubesse tocar música brasileira, então recusa-se a partir sem a banda. Getúlio ajuda-a a levar a banda consigo. Ela seria a imagem do Brasil nos EUA, a embaixadora da Boa-vizinhança. E ela leva isso a sério, quase como uma missão: "Meus queridos amigos. Sigo para Nova Iorque onde vou apresentar a música da nossa terra. Às vezes tenho medo da responsabilidade. Lembrem-se sempre de mim que eu nunca os esquecerei." Dias depois Carmen e a sua banda embarcava no navio S.S.Uruguay.

A Carmen Miranda que chegou a Nova Iorque não era a mesma Carmen Miranda que deixara o Brasil. Respondia as primeiras perguntas na América, com o pouco de inglês que sabia, ingénua, dando respostas tolas e sem sentido. E foi por essa Carmen que eles se apaixonaram."Meu querido Almirante. Aqui vai uma cartinha contando-te que a tua amiga, segundo jornais, é a grande sensação da Broadway. A minha estréia foi algo indescritível. Eles não entendem patavinas do que eu canto, mas dizem que sou a artista estrangeira mais sensacional que até hoje apareceu aqui." Carmen Miranda não entendia isso. Ela não percebia que poderia cantar em qualquer língua e que iria ser o mesmo sucesso - era ela que os fascinava. Nasce a Brazilian Bombshell, e Carmen torna-se moda. Carmen Miranda parte definitivamente para Los Angeles a 3 de Outubro de 1940.Ela e a sua banda trabalham muito: fazem o primeiro acto do musical Streets of Paris, na casa Versailles, faziam o primeiro acto numa casa nocturna e voltavam ao Versailles para encerrar o musical. A divisão da renda era de 50% de Carmen e banda e 50% dos irmãos Schuberts.

"Meus queridos e saudosos amigos ouvintes do Brasil. Boa noite. Os aplausos que escuto todas as noites na Broadway parecem-me o eco dos aplausos dos brasileiros contentes por ver o sucesso da sua musica popular nos Estados Unidos. Novamente digo que tudo farei para sempre corresponder às gentilezas do público da minha terra. Adeus Brasil. Até a volta e bye-bye."Mas o Brasil não acreditou no sucesso de Carmen, pois no Brasil o samba era coisa de favela, não aceite pela sociedade.Passou um ano e meio até ao seu regresso ao Brasil. Um grande estrondo na sua chegada. O Departamento de Imprensa e Propaganda, órgão do governo Vargas, preparou uma recepção oficial para a sua chegada. No dia seguinte, os jornais falaram mal. Aquilo não era recepção para cantora de samba, e sim para um grande cientista ou um grande músico. O samba era do povo.A sua primeira apresentação também não foi muito boa. Cantando para uma plateia de convidados especiais de Dona Darcy Vargas, não se sente no meio do seu verdadeiro público. Cumprimenta em inglês: "Good night, people." Silêncio. Canta South American Way, uma versão americanizada de uma música de ritmo brasileiro. Novamente silêncio. Resolve então encurtar o show, tocando apenas mais algumas músicas. No final, vaiaram-na, alegando que ela havia voltado americanizada. Talvez fosse ciúmes. Nunca se soube o motivo daquelas vaias que tanto magoaram Carmen Miranda. No dia seguinte, na sua última apresentação no Brasil, desta vez ao seu público, o povo, cantava "Disseram que voltei americanizada", tranquilizando a sua gente. Nesse dia, recebe um telegrama da Fox convidando-a a ir para Hollywood gravar filmes.Chegou a Hollywood na época dourada do cinema. Comprou uma casa em Beverly Hills, na actual Carmelita Avenue, para a qual levou a mãe, a irmã Aurora e o cunhado. Todos os que trabalhavam e conviviam com ela a amavam, achavam-na uma óptima pessoa.

A 20th Century Fox ganhou muito dinheiro com ela, contudo Carmen Miranda tinha a Fox nas mãos: ela podia parar de fazer o sotaque que tanto agradava aos americanos, ou não fazer mais os seus papéis de bahiana. Torna-se a actriz mais bem paga nos EUA. E 6 meses depois de deixar o Brasil, ela deixava as suas marcas na calçada da fama:"Meus queridos amigos de todo o Brasil. Aqui estou falando a vocês do Chinese teatro de Hollywood, onde acabo de botar minhas mãozinhas e meus pezinhos no cimento. Podem crer que foi um dos momentos mais felizes da minha vida. E nesse momento eu juro que pensei em vocês. Uma grande saudades e meu beijo melhor."Carmen Miranda deixa a sua marca no passeio da fama
Começa o auge da política da boa vizinhança. Ela torna-se a musa da América Latina, promovendo as forças aliadas na Europa. Os filmes de Carmen Miranda foram colocados entre os desenhos de Walt Disney para agradar a América Latina. Os jornalistas do Brasil não gostam.Carmen Miranda sempre sonhou em fazer outros papéis, maiores, mas estava presa pela imagem da bahiana. E com o fim da guerra, a política norte-americana mudou. Não havia mais pressão sobre filmes para a América Latina. Carmen tinha a sua grande oportunidade, mas precisava de ser rápida para não perder o seu prestígio. Comprou o seu contrato com a Fox por 75 mil dollars, e gravou Copacabana, um filme mau, onde ela aparecia loira e em preto-e-branco. Durante as filmagens, conheceu o seu marido, o produtor David Sebastian, com quem se casou contra a vontade da família, pois percebiam o puro interesse da parte dele. David era duro, ríspido quando eles estava a sós irritava-se muito facilmente e expressava sua irritação muitas vezes fisicamente com ela.Então ela começou a ficar doente e deprimida, mas disfarçava. O casamento já havia acabado, mas ela era impedida de separar-se por pressões da sociedade e porque a mãe, Dona Maria, não aprovaria.Nessa época fazia dois shows: um às 9 horas e outro à meia-noite. Eles eram cansativos, porém, como fazia muito movimento, ela ficava agitada e, para conseguir dormir, tomava calmantes. No começo 2, e no final de sua vida, 10. Quando acordava, estava zonza e para despertar para os shows, tomava estimulantes.Atormentada pelos problemas domésticos e pelos remédios, Carmen teve um colapso nervoso. Depois de 14 anos longe, ela voltava ao Brasil. Ainda dentro do avião, arrumou-se para parecer bem ao público. Por ordem médica, ficou num quarto de hotel por várias semanas, recebendo apenas visitas da família. Sofria de depressão aguda. Tinha crises de ansiedade ao olhar pela janela do seu quarto e ver o mundo à sua volta. Estava desorientada pelos tratamentos de choque, comuns nessa época, os quais prejudicaram a sua memória e a deixaram abalada.
Então, cercada pelos amigos e pela família, ela começa a dar sinais de vida e melhora. Voltou para os EUA e continuou na sua louca rotina de shows por mais seis meses, quando num programa de TV de Jimmy Durante, cai de joelhos e quase não pode respirar. Levanta-se e sai. Essa é a última imagem de Carmen Miranda. Ela morreria naquela noite de 1955, aos 46 anos, caída no seu quarto com um espelho na mão.Realizou-se uma missa na Igreja Católica do Bom Pastor, em Beverly Hills. O seu caixão desembarcou no Brasil coberta pela bandeira brasileira, escoltado pela multidão que prestava a sua última homenagem.Carmen Miranda transportou o Brasil na sua bagagem, fazendo com que toda a gente que não conhecia o Brasil, adorasse a sua música e o seu ritmo. O Brasil terá sempre uma divida impagável com Carmen Miranda.

Heitor Villa-LobosBaseado no documentário "Banana is my Business", de Helena Solberg e David Meyer.

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